quinta-feira, 14 de janeiro de 2021

carta à Audre lorde

https://diariosincendiarios.wordpress.com/2018/09/25/carta-a-audre-lorde/amp/

(em resposta ao texto A Transformação do silêncio em linguagem e ação)

“Eu estou aqui como poeta Negra lésbica e sobre o significado de tudo isso repousa o fato de eu ainda estar viva, coisa que poderia não ter sido.”

Audre, em minhas muitas tentativas de romper os silêncios que atravessam meu corpo, eu aprendi que o lugar onde ele se instala é justamente onde mais faz ruídos. E o ruído rasga cada sopro de voz, por dentro, muito antes de se tornar vento.

Desde muito cedo eu fui ensinada a calar, a catar todas as palavras que me vinham à boca e amassar, amordaçar, frear. Aprendi a silenciar todos aqueles rasgos a mim direcionados. Os olhares que me lançavam, como navalhas, reafirmavam cortantes, o peso de tudo.

Eu ainda era menina quando todas essas dores me alcançaram. E não sabia ao certo porque doía, mas sabia o quanto doía. Não conseguia falar, não tinha com quem falar, eu estava diante de mim mesma e sem saber o que fazer com aquela imagem que ecoava dolorosa frente aos meus olhos e sentidos. Fui durante muito tempo o espelho daquilo que me diziam ser errado, feio, sujo. Tentei ser diferente e a cada tentativa frustrada um pouco de mim se esvaia. E você sabe, Audre, o quão é doloroso passar pelas violências que a lesbofobia atrelada ao racismo impõe sobre nossos corpos.

Desde a minha infância fui muito introspectiva, muito silenciosa, muito para dentro. O meu primeiro impulso para fora do silêncio, foi quando, ainda na escola, numa aula de português, sem querer, tropecei em um poema num livro didático e algo em mim se movimentou de uma forma diferente e me impulsionou à escrita.  Pensei: talvez pôr as dores no papel as façam menos doloridas.

Logo quando comecei a escrever não tinha uma consciência exata do que eu pretendia com aquilo e tampouco enxergava a escrita como uma forma de resistência – embora fosse -, só queria um pouco de alívio. O intuído era aliviar tudo aquilo que insistentemente latejava em meu corpo. Busquei nas palavras uma maneira de ressignificar e transformar essas dores em alguma coisa que não me desse um soco dentro da boca. Não foi fácil e ainda não é. Ainda estou nesse exercício de transformar o silêncio em linguagem e ação. Pergunto: um dia deixaremos de ter silêncios a romper? E, certamente, a resposta será não. Porque entre os ruídos e os não-ditos há tantas outras coisas.

Uma vez enquanto conversava com uma amiga sobre toda essa minha dificuldade em romper o silêncio, ela me disse algo que me fez parar por alguns minutos e logo após esse breve momento de paralisia, aquela fala me deslocou. Ela me disse: “As coisas só começam a existir quando você fala sobre elas. Você só vai começar a existir enquanto uma poeta negra e lésbica quando você começar a se enxergar (e se enxergar é estabelecer um diálogo consigo e com os outros) e a falar sobre quem você é e sobre o que é estar nesse lugar”. E isso me causou um imenso estranhamento e espanto logo quando ouvi.  Porque, pela segunda vez, eu saí do seio do silêncio, porque eu queria e precisava existir, e foi como se eu tivesse ouvindo: “Fala para elas de como nunca se é uma pessoa inteira se guardas silêncio, porque esse pedacinho fica sempre dentro de ti e quer sair, e se segues ignorando-o, ele se torna cada vez mais irritado e furioso, e se nunca o deixa sair um dia diz: basta! E te dá um soco dentro da boca.”

Esse sentimento de possível inexistência misturado à necessidade de existir ecoou em mim durante alguns dias. A sensação foi de imersão em mim mesma e nos meus medos. Afinal, o que me paralisava? Após dias em uma conversa muito íntima com o silêncio, cheguei à conclusão de que o que me emudecia era o medo. O medo da visibilidade e do seu enlace mais profundo: a vulnerabilidade. Ao tomar uma assustadora consciência de meus próprios abismos, adentrei uma percepção ainda mais funda: meu corpo sempre foi o alvo e a vulnerabilidade nunca esteve distante de tudo que represento. Continuar cultivando o silêncio se configura como uma autopreservação forjada e agora o meu corpo já tinha consciência disso.

E foi nessa de conversar com o silêncio e apalpar as suas minucias que o atravessei.
Em alguns momentos, trocamos: fui silêncio e ele música, fui nota e ele ficou calado, no escuro. Repare, eu disse, nota. Fui nota, notada, acordes e música. Fui ouvida e falada. Fui a palavra cantada nos meus próprios ouvidos.

Mas, o medo de falar ainda rasga a segurança que cuidadosamente vem sendo construída.
A boca do silêncio ainda arranha as tantas possibilidades de sopro.

Concordo com você, Audre, quando diz que: “Podemos aprender a trabalhar e a falar apesar do medo, da mesma forma que aprendemos a trabalhar e a falar apesar de cansadas.”

E acredito que o silêncio pode ser configurado de duas maneiras: como uma potência significativa ou sendo capaz de produzir a própria noção de silenciamento, que para muito além de estar em silêncio, configura-se como pôr um sujeito em silêncio.

Eu quero poder tocar o silêncio, poder estar em silêncio por escolha, não por medo. Claro, é sim necessário e importante romper o eixo onde o silêncio aprisiona, mas podendo preservar o ponto onde ele é conforto.

O silêncio não é só o que está visível, ou seja, aquilo que está além da boca, ele pode estar também fazendo sentido e significando em outros lugares – às vezes como conforto, noutras vezes, como prisão –  e produzindo nas próprias palavras os ecos desses trânsitos internos. Podermos escolher o momento de falar e o momento de estar em silêncio é um ato de autopreservação, reconhecimento dos nossos limites e respeito aos nossos cansaços.

Eu quero poder me libertar do medo de pôr o meu corpo em evidência, mas ainda restam tantos silêncios para romper.


quarta-feira, 13 de janeiro de 2021

Muito obrigada pela iniciativa de DIALOGAR. Dialogar, amigas-amigues-amigos, é um fala e o outro escuta. Escutar por sua vez é INDISPENSÁVEL para todos, isto é,  tanto para quem fala, quanto para quem escuta.  Escutar é uma sabedoria elementar mas que não está na moda. Espero que seja possível dialogar de fato com sua gestão,  porque você merece ser ouvido por muitos louvores enquanto profissional e pessoa que és.  Também nossos artistas devem ser escutados em seus gritos simbólicos,  cheios de indignação por muitas vezes serem calados na indiferença,  na ingratidão por seus legados. No mais, vamos sim avançando, progredindo e criando laços de democracia e reparação aos mais indispensáveis atores na cultura da alma. A alma tem sua aventura na percepção.  É arte que chama quando a alma da gente transborda em estética, transformando o instante em intuição sobre um infinito ser.

terça-feira, 12 de janeiro de 2021

monopólio, monogamia, Foucault, Gerda Lerner e muita história pra contar

Eu tenho até uma diferença para essas definições de monogamia e poligamia, baseada em uma ideia que li no livro do Foucault "História da sexualidade: o cuidado de si ". O livro que trata de fato sobre a história da sexualidade - a partir do recorte eurocêntrico do início da era "Depois de Cristo", entre os anos 3 e 5 mais ou menos - traz uma ideia interessante sobre um termo que é "monopólio", uma denominação do Foucault para o casamento heterossexual, que eu chamo de heterodeterminado, o que para mim também cabe na denominação de patriarcal. Essa forma de monopólio serveria, segundo Foucault,  para concretizar o controle sexual tanto de homens quanto de mulheres, principalmente da parcela privilegiada e, por isso, mais representada socioculturalmente. Os dominantes deveriam se casar entre si (o que às vezes seria até um tipo de homogamia, ou casamento entre famílias afins e parentes,  como os Judeus). Esse monopólio, então, para mim, é bastante diferente da monogamia porque ela é intermitente na trajetória histórica dos indivíduos,  isto é, ora somos monogâmicos, noutra polígamos e até passamos algum tempo sem nos relacionarmos afetivamente de modo especificamente,  dito amoroso. Então, para mim, o que conhecemos como monogamia é,  de fato, monopólio que principalmente,  diferente do que propusera Foucault sobre aquele momento histórico é aquele recorte social,  atinge muito mais as mulheres com um controle social, sexual e política indiscutivelmente.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2021

A formação em saúde é regida por uma heteronormatividade tão brutal que uma mulher lésbica tem seu cuidado em saúde negligenciado por que segundo os profissionais que a atendem, ela é "virgem" e por isso não pode ser examinada da forma como outras mulheres heterossexuais são.

VIRGEM! 2021 e profissionais de saúde ainda precisam do aval de um pênis para fazer o seu trabalho. Assim, uma mulher com endometriose ou outro comprometimento do seu aparelho ginecológico é orientada a não fazer um simples ultrassom transvaginal por que o transdutor vai penetrar sua vagina nunca antes penetrada por um pênis! Afff! Que burrice, que ignorância e que desconhecimento sobre as diversas formas de práticas sexuais, meu povo! Isso é objeto de estudo, também. Pode e deve ser aprendido.

Mulheres lésbicas podem compartilhar objetos durante relações e isso pode ser meio de transmissão de IST's, SIM! Elas devem fazer coleta de preventivo, sim! E se você tem alguma dúvida em relação às práticas sexuais delas e os cuidados médicos que elas demandam, PERGUNTE SOBRE ISSO A ELAS.

Fora que essa ideia de que primeiro precisa entrar um pênis na vagina para que ela possa ser examinada por um profissional de saúde é tão atrasada, machista e nada científica que chega a me dar vergonha.

A vagina é só uma parte do corpo feminino. Mais uma. Sim, envolvida em incontáveis tabus, mas é apenas uma região do corpo que precisa de cuidados específicos.

Acaso a mulher que nunca fez sexo oral com um homem não pode ter sua garganta examinada? Uma mulher que nunca praticou sexo anal não pode ter uma queixa intestinal investigada?

Recentemente, vi a Ginecologista Sincera conversando sobre isso na página dela e os relatos são absurdos.

E tem um debate muito mais cheio de tabu que é o debate da tal da virgindade... O valor que se dá a isso compromete a assistência a saúde das mulheres! Um horror!

E até onde eu sei, a tal da virgindade tem a ver com nunca ter transado. Ou seja, a mulher que foi estuprada nunca transou. A mulher que faz um ultrassom transvaginal nunca transou. A mulher que precisa fazer um exame ginecológico nunca transou. Mas as pessoas estão ligadas numa membrana que precisa estar intacta.

Aí, dessa lógica, nasce a ideia de que mulheres lésbicas que transam e são plenas e felizes exercendo a sua sexualidade são virgens! Que coisa bizarra! É tudo sobre o aval masculino, né. É tudo sobre o pênis, aquele órgão definidor de nossas vidas, da nossa moral, da nossa capacidade de ser mulher, e agora até da nossa saúde... Preguiça!

domingo, 10 de janeiro de 2021

Para minha amora dia e noite,

Vou traduzir o que eu disse...que tem trechos que não dá pra ouvir:

Deixa eu te dizer uma coisa linda...
Existem portas que a gente deixa aberta pra semlre entrar e sair
Mas existem portas que a gente fecha e se tranca, a gente se prende 
É a gente que tem a chave do cadeado da nossa cela
A nossa prisão - na verdade -, passarinha...passarinha...(tu és a minha passarinha predileta)
A nossa gaiola, passarinha, a nossa gaiola-coração tá sempre  aberta...
Mas como a gente tem a chave na mão, a gente pensa que o cadeado tá fechado...
Abre a porta
Abre a janela e vai...
Vai voar...
É que você é grande demais...
o céu inteiro é a sua casa.

A porta nunca esteve trancada, passarinha

mensagem que cura...massagem, ciências, humanidade e corpos que cuidam

Eu faço análise - minha psicanalista me salvou do beira do abismo, estou sempre  preparada para pular.  Tive que dar um tempo da análise durante a pandemia, por precaução.  Fui ao extremo de surtos de pânico, tranquilizante,  sedação...dormir  era coma induzido.  Então, fui ao psiquiatra, tipo ao meu pior inimigo. Ele me olhou como um destroço de gente que eu tava...e disse "junte devagar...seu caquinhos". Disse com uma receita que na primeira vez me trouxe a sensação de que eu estava viva. Tomei os três psicofármacos e senti o corpo que estava vazio...eu era uma alma penada, o espelho tava escondido. Foi assim que peguei o milk, coloquei no táxi.  Mudei de casa. Moro só com ele há 6 meses...quase nenhuma assombração que eu me familiarizara estava mais de companhia da minha própria sombra na luz do mundo barulhento...aterrorizante.  Ter paranoia é viver um delírio.  Eu preciso dos remédios para trabalhar feliz, ler em paz, dormir e existir realmente sem fantasmas (literalmente) - esse é o nome que eu dei aos pensamentos intrusos da minha cabeça sem cuidado de antes. Agora, eu estou fazendo um programa de massagens curativas, terapêuticas... A minha curadora,  uma mulher admirável antes de tudo, completou o ensino médio a duras penas. E eu, repleta de livros, minha bibliografia é sempre imensa, citação direta e indireta é minha senha de banco... que sou só isso... na mão de cura dela, renasço. Pago com vil metal ao que não tem preço, nem mensura. Ela faz massagem com óleos,  cores, meses e energias de uma linguagem que eu não sei ler uma letra. Ela faz massagem que cura gente inteira. Eu me entrego na sua vocação serena de 2 décadas.  Ela me ensina com paciência, cuidado e humildade a ser eu mesma.  Eu gosto do trabalho que reescreve a nossa história. Eu acredito muito nisso.

mulheres que MATAM os lobos

Esse arquétipo do "lobo", "o selvagem do bem", é muito vendável. De fato, a heterossexualidade normativa é um instrumento VIOLENTO para qualquer mulher, eu te entendo muito. Essa situação ABSURDA de mitificar o "macho natureba" passa despercebida...MAS É VIOLÊNCIA. Os homens como sempre estão no topo da cadeia alimentar como predadores, idolatrando-se, gozando em berço esplêndido de uma MASCULINIZAÇÃO da miséria do espírito. Eles são vazios de densidade subjetiva, isto é,  meros fantoches da venda de "afetividade" líquida.  Mulheres estão  no substrato, onde protagonistas se fazem minhocas. As minhocas são indispensáveis para a vivacidade do bioma, mas quem nasceu para ser a própria floresta,  não deveria se colocar em posição de chão para ser pisoteado por abutres. Essa é a minha metáfora de dor, sofrimento psíquico,  quando assisto ao culto desprezível ao que se fantasia de cultura nórdica. Infantis são as analogias ficcionalizadas. Historiografias nunca estão na moda porque trazem dos cemitérios arqueológicos o que de fato foi o humano daquele período.  Então, eu apenas vejo, sinto muito, alcanço o nojo rápido e transbordo em forma de mulheres da realidade - do chão desse mundo - que leio. Só elas me curam. Estou cansada dessas ficções alienantes que são jogadas feito agrotóxicos nas redes sociais em meus pés de realidade onde vivo. Mas...sem que se exista na história,  não se está  vivo. Por isso, eu falo, por isso  eu grito, por isso EU LUTO. Sigamos, como sempre, juntas na luta feminista que nos CUIDA muito . Beijos, paxãozoooona da minha rede social 💜💜💜💜💜♀️💜♀️💜♀️💜♀️💜♀️🌬🍃🤍

segunda-feira, 4 de janeiro de 2021

manifesto educAÇÃO

EducAÇÃO = prática humana de aprender  JUNTO 

Para que a educação seja um DIREITO GARANTIDO precisamos ACABAR COM A MENTALIDADE BANCÁRIA,  mercadológica, de educar.

Professores NÃO são DOMINADORES do conhecimento que DEPOSITAM nos alunos = EDUCADORES somos aqueles que acreditam que TODOS aprendem quando há a DISPOSIÇÃO ÉTICA (HUMANITÁRIA) de construir o processo de aprendizagem DIALOGICAMENTE.

Alunos NÃO são pessoas que precisam aprender algo que não sabem = EDUCANDOS são, juntamente com educadores, PESSOAS que acreditam que aprender é UM PROCESSO DE DIGNIDADE humana a fim de se construir EM CONJUNTO uma comunidade, uma sociedade e uma humanidade cada vez mais JUSTA.

Educação NÃO é escolarização CORPORATIVISTA, MERCADOLÓGICA, NEOLIBERAL, PARTIDARISTA E INSTRUMENTALISTA.

Eu DEFENDO A EDUCAÇÃO PÚBLICA, ÉTICA, DEMOCRÁTICA,  HUMANÍSTICA, ECOLÓGICA, UNIVERSAL E GRATUITA. 

Educação é um saber que seres vivos conduzem historicamente a partir de seus contextos.

Respeito à EDUCAÇÃO é o que eu EXIJO!

O Brasil NECESSITA de educação de verdade.

Vamos defender a educação para a humanidade e para a ecologia ética JÁ!

#eudefendoaeducação