terça-feira, 26 de março de 2019

Texto lindo... página do Facebook "Ventre feminista"

Tem um texto de uma escritora portuguesa chamada Matilde Campilho que começa assim :
 "Escute só, isto é muito sério.
Anda, escuta que isso é sério!
O mundo está tremendamente esquisito"

Sim Matilde, o mundo está tremendamente esquisito. Não há como discordar.
E o desamor anda solto. Parece até cafona gostar dos outros.
O caso é que sou cafona e gosto dos outros. E meu jeito mais sincero de demonstrar amor é através do cuidado.
Meu pai não está muito bem nos últimos tempos. Claro que isso me abala. Ele é idoso, está com a saúde frágil. Até poucos dias eu levava almoço pra ele. Agora levo almoço e janta. Ele precisa comer direitinho. E me deixa feliz poder fazer isso por ele. Alimentar alguém, pra mim, é uma forma de ofertar vida, sabe?
Hoje um dos meus cachorrinhos começou a gritar de dor. A unha da patinha tinha quebrado e entrado na carne dele. Uma dor imensa, imagino. Chamei a veterinária, ela veio e ele está bem agora. Cuidar dele e vê-lo bem me alivia o peito.
Agora há pouco eu estava na cozinha fazendo comida (sim, de novo) para meu filho que vai chegar do estágio. Ele poderia fazer a própria comida? Claro que poderia e faz na maioria das vezes. Mas eu gosto de cozinhar pra ele e ouvir ele dizer "tava uma delícia mãe! Obrigado!"
Faço porque gosto, de verdade.
Sim, o mundo está tremendamente esquisito. E a gente vai deixando de cuidar da gente, de cuidar de quem a gente ama e de aprender a receber cuidado também quando precisamos. Às vezes ninguém oferece cuidado. Eu sei. Não vivencio atualmente, mas sei porque já vivenciei.
Tô falando de cuidado aqui e sei que pode surgir alguém para levantar a lebre de " cuidar dos outros é um papel social das mulheres imposto pela sociedade patriarcal" Concordo. É sim, e eu sei que é. Mas eu GOSTO de cuidar das pessoas (já disse isso?)
Eu gosto de sentar aqui quando posso e ler os relatos de vocês. Eu gosto de poder oferecer uma palavra de conforto quando há palavras que confortam. Eu gosto de cozinhar para meu filho, para minha família, para meus amigos. Eu gosto de ouvir os problemas das minhas amigas e procurar, junto com elas, as soluções. Eu gosto de dar lembrancinhas pra quem eu amo. Eu gosto. Eu gosto de gente. Gosto de bicho. Gosto de existir e sou grata pela honra de poder ofertar um pouco de acolhimento e afeto num mundo tão, tão tremendamente esquisito.
E como diz um outro trecho do texto/poema de Matilde Campilho :
" eu acredito que exista, agora, alguém profundamente acordado. Alguém que esteja vivendo entre o intervalo tênue entre o sonho e a agilidade. Suponho que ele saiba perfeitamente que este começo de século será nosso batismo do voo para nossa persistência no amor."
Eu acho que cuidar (e receber cuidado) é uma forma bonita de persistir no amor.
Cuidem de vocês, como se vocês valessem ouro (na verdade vocês valem MESMO!) E se puderem e quiserem, cuidem, na medida do possível, de quem vocês amam. Seja bicho ou gente.
O mundo tá ruim, esquisito, doido e doído. Mas a gente pode e deve persistir no amor.
SUGESTÕES DE LEITURA, ENQUANTO ELES COMEMORAM O ANIVERSÁRIO DO INFAME GOLPE DE 1964:

A expedição Montaigne (1982), de Antonio Callado
A festa (1976), de Ivan Ângelo
Ainda estou aqui (2015), de Marcelo Rubens Paiva.
Amores exilados (1997), de Godofredo de Oliveira Neto
A noite da espera (2017), de Milton Hatoum
Antes do passado: o silêncio que vem do Araguaia (2012), de Liniane Haag Brum
A resistência (2015), de Julián Fuks
As meninas (1973), de Lygia Fagundes Telles
Avalovara (1973), de Osman Lins
A voz submersa (1984), de Salim Miguel
Azul corvo (2010), de Adriana Lisboa
Bar Don Juan (1971), de Antonio Callado
Cabo de guerra (2016), de Ivone Benedetti
Em câmara lenta (1977), de Renato Tapajós
Em liberdade (1981), de Silviano Santiago
Feliz ano velho (1982), de Marcelo Rubens Paiva
Felizes poucos (2016), de Maria José Silveira
História natural da ditadura (2006), de Teixeira Coelho
Incidente em Antares (1971), de Érico Veríssimo
K.: relato de uma busca (2011), de Bernardo Kucisnki
Lobos (1997), de Rubem Mauro Machado
Mulheres que mordem (2015), de Beatriz Leal
Não falei (2004), de Beatriz Bracher
Não verás país nenhum (1981), de Ignacio Loyola de Brandão
Nem tudo é silêncio (2010), de Sônia Regina Bischain
Nos idos de março (2014), org. de Luiz Ruffato
O indizível sentido do amor (2017), de Rosângela Vieira Rocha
O fantasma de Buñuel (2004), de Maria José Silveira
O que é isso companheiro? (1979), de Fernando Gabeira
O torturador em romaria (1986), de Heloneida Studart
Os carbonários (1980), de Alfredo Sirkis
Os pecados da tribo (1976), de José J. Veiga
Os que bebem como os cães (1975), de Assis Brasil
Os tambores silenciosos (1977), de Josué Guimarães
Os visitantes (2016), de Bernardo Kucinski
Outros cantos (2016), de Maria Valéria Rezende
Palavras cruzadas (2015), de Guiomar de Grammont
Paris – Rio – Paris (2017), de Luciana Hidalgo
Poemas do povo da noite (2017), de Pedro Tierra
Primeiro de abril (1994), de Salim Miguel
Quarup (1967), de Antonio Callado
Reflexos do baile (1977), de Antonio Callado
Retrato calado (1988), de Luiz Roberto Salinas Fortes
Silêncio na cidade (2017), de Roberto Seabra
Sombras de reis barbudos (1972), de José J. Veiga
Um romance de geração (1980), de Sérgio Sant’Anna
Volto semana que vem (2015), de Maria Pilla
Zero (1975), de Ignacio Loyola de Brandão