segunda-feira, 9 de março de 2020

Eu não sou ninguém para vir defender ou condenar, mas estou muito perplexa com os comentários transfóbicos que se espalham por causa dessa situação. Não tem como não assemelhar o tratamento discursivo de muitas pessoas (mulheres, homens, feministas ou não) com fascismo. É muito óbvio o critério seletivo. Não quero defender nenhum tipo de crime. Sou absolutamente contra a cultura do estupro e qualquer forma de apologia a esse crime irreparável. Me solidarizo com as vítimas, pessoas que já sofreram e com qualquer situação nesse universo de abuso sexual. Porém, não consigo enxergar na condenação compulsória dos discursos contra Susy nada de bom. A transfobia é um crime, mas também uma ideologia de purismo genético, biológico, sem qualquer benefício humanitário. Fazer justiça com as próprias palavras em um canal como o Facebook é discurso de ódio e não surpreendentemente foi iniciado nos porões do fascismo. Hannah Arendt quando foi analisar o caso de um fascista chamado Eichmann identificou uma semente (origem) fascista em uma pessoa comum. Ela chamou de "banalização do mal". Qualquer humano sem priorizar a ética humanitária tende ao extremismo e ao ódio gratuito que estimula genocídio. Eu sou contra isso. Também, consigo ver nitidamente o racismo que se escancara no caso de Susy, muitas pessoas condenam ela e toda a população negra trans ou não  que está em sua maioria povoando as nossas cadeias, que parecem um apartheid legalizado. Susanne Von Richthofen está sendo cotada para ser protagonista de um filme e foi abraçada por uma comunidade evangélica. Sem querer equiparar crime bom e crime ruim, não tem como não perceber que a condenação fatal é transfóbica e racista. Se a justiça está para a democracia como uma garantia dos direitos de qualquer pessoa, não posso discordar de que ela está pagando por sua pena, como poderia acontecer comigo, mas em condições indiscutivelmente piores. Eu sou branca, eu sou cis, eu tive oportunidade de fazer universidade. Então, o que eu percebo é que precisamos tomar cuidado para não fortalecermos nosso maior inimigo, o patriarcado, branco, misógino e fascista.

Um comentário:

"Quebrem as correntes dos seus pensamentos e conseguirão quebrar as correntes do corpo..." ("A História de Fernão Capelo Gaivota" BACH, 1970, p. 122/3).
Hilda Freitas, Belém/PA